As empresas de distribuição DHL, UPS e Fedex apostam em tecnologia e logística para aumentar a eficiência e desafiar os correios, que ainda dominam o setor no Brasil
DHL desde 1976 Funcionários: 11,6 mil Faturamento global: € 60,4 bilhões Inovações: drones de vigilância, robôs colaborativos, realidade aumentada e veículos semiautônomos
A uma hora de Manhattan, o distrito mais conhecido de Nova York, está localizado um dos maiores centros de distribuição de mercadorias dos Estados Unidos. Ele pertence ao grupo Deutsche Post DHL, empresa alemã especializada em armazenamento e distribuição. Com 18,5 mil m², o espaço reúne o que há de mais moderno em automação: os pacotes são colocados em esteiras velozes com codificadores que fazem a triagem automática do endereço de entrega e direcionam o produto para a distribuição. A substituição do trabalho manual por máquinas faz a unidade processar 40 mil encomendas por hora, 60% a mais do que normalmente é despachado em unidades sem essa tecnologia.
Mas essa é apenas uma das ações que a DHL implementou para driblar problemas com logística e revolucionar as entregas. Em Manhattan, conhecida por suas ruas estreitas e congestionadas, a companhia apostou em instalar uma unidade que concentra os pacotes e usar transportadores que vão a pé para levar o produto até o consumidor. “O comércio eletrônico é impulsionado em grande parte pela experiência que o cliente tem ao receber o seu pedido”, diz Greg Hewitt, CEO da DHL Express nos Estados Unidos. Segundo o executivo, um dos principais desafios do setor é a última milha, como é chamado o trecho final percorrido para que uma encomenda chegue ao destino. Por isso, a DHL tem estudado também outras soluções, como o uso de drones. Seguindo o movimento iniciado pela Amazon há dois anos com o programa Prime Air, a DHL lançou 130 dispositivos voadores para transportar medicamentos e artigos esportivos na Alemanha. Resultado? O tempo de entrega na última milha caiu de 30 minutos para 8 minutos.
Engana-se, porém, quem pensa que essa é uma realidade utópica para o Brasil. Além da DHL, outras duas multinacionais têm investido em soluções tecnológicas para conquistar uma fatia do mercado local, atualmente dominado pela estatal Correios. O interesse das companhias reflete o novo comportamento do consumidor que, com a facilidade proporcionada pela internet, impulsionou as compras online. Se antes mais da metade das receitas globais das redes de transportes vinha do envio de cartas, agora essa modalidade perde espaço para as encomendas expressas, que representam cerca de 20% da captação total de recursos, de acordo com a União Postal Universal (UPU). As vendas em e-commerce no Brasil também reforçam essa tendência. Dados do Ebit mostram que, só no primeiro semestre de 2018, o faturamento das vendas online no País ultrapassou R$ 23,6 bilhões – o dobro do que foi registrado há cinco anos no mesmo período. Agora, todas se preparam para uma nova fase das entregas expressas: a chamada indústria 4.0.
DRONES E ROBÔS Para transformar o modelo de negócios das entregas por meio de tecnologia de ponta, a americana United Parcel Service (UPS) tem investido US$ 1 bilhão por ano para pesquisar soluções. Nos Estados Unidos, a empresa já faz, desde 2016, algumas entregas de remédios por drones em áreas remotas e em situações de desastres naturais. Mesmo sem data, o modal já está no radar da companhia para a operação brasileira. “Essa é uma solução que vai acontecer no Brasil”, diz Nadir Moreno, CEO da UPS no País. “Os drones têm sido parte das nossas discussões para atender a localidades de difícil acesso”. Na operação local, a executiva conta que parte do investimento em pesquisa também foi aplicado em um software que diz como os pacotes devem ser posicionados no veículo de entrega.
Como uma espécie de “Tetris”, o programa busca ganhar tempo no carregamento e na entrega, evitando que o veículo parado seja vítima de ladrões de cargas.
No Brasil, além de já usar drones para fazer a vigilância dos seus armazéns, a DHL também estuda a possibilidade de usá-los na última milha. Nas unidades de Supply Chain em São Paulo, a empresa trouxe recentemente dois robôs para a linha de montagem. As máquinas auxiliam na abertura e fechamento de caixas, na separação das encomendas e nos deslocamentos de carga que antes dependiam de um operador para levar os carrinhos de um lado para o outro. “Os robôs eliminam atividades repetitivas e que tomavam muito tempo”, afirma Maurício Barros, presidente da unidade no Brasil. “Eles melhoram a eficiência e a produtividade da nossa operação interna, o que reflete na velocidade final da entrega.” Outra preocupação do executivo é com o treinamento da equipe. Há um ano, os funcionários passaram a utilizar óculos com realidade aumentada para simular a maneira correta de realizar as tarefas logísticas dentro dos centros, o que reduziu o tempo de treinamento de 10 dias para apenas cinco.
Na esteira de inovações, a Fedex também não fica para trás. Dona de um faturamento global de US$ 67 bilhões, a empresa americana iniciou suas atividades no Brasil em 1989. Hoje, os esforços estão centralizados na modernização da frota e em sistemas de blockchain, um banco de dados que auxilia no rastreamento de cargas e otimiza o processo de despacho das remessas.
Por ora, a empresa tem planos menos ambiciosos do que as concorrentes para entregas na última milha. Por outro lado, tem investido em ações para minimizar o impacto ambiental, desde 2014, quando parte das encomendas começaram a ser entregues por veículos elétricos. Com isso, 840 toneladas de volume de CO2 deixaram de ser emitidas na atmosfera.
Drones já são usados para entrega de remédios em áreas remotas dos EUA
O diferencial da companhia, segundo Juan Cento, presidente da FedEx Express para a América Latina e Caribe, é na solução logística. Ele relatou que, para concluir uma entrega em um sítio de difícil acesso em Minas Gerais, a equipe entrou em contato com o proprietário e pediu que ele colocasse um pano laranja na porta da casa para facilitar a localização. “Um time comprometido faz toda a diferença, quando até mesmo as tecnologias mais modernas não podem ajudar”, declara.
Segundo analistas do setor, implementar tecnologia de ponta para otimizar entregas é um caminho sem volta. Ainda assim, o Brasil tem uma série de gargalos que impedem a expansão dessas inovações. “Não é mais possível fazer logística de alta performance sem tecnologia”, diz Pedro Moreira, presidente da Associação Brasileira de Logística (Abralog). “Para acontecer uma revolução nas entregas, o governo precisa acertar os problemas de infraestrutura, segurança e burocracia”, diz. Um levantamento realizado pela Fundação Dom Cabral ilustra essa perspectiva. Nos últimos 20 anos, o Brasil investiu apenas 0,8% do PIB em infraestrutura de transportes, quando deveria desembolsar 2,5%. Para ter uma operação logística competitiva e compatível com as grandes economias do mundo, seria necessário investir R$ 300 bilhões até 2035. “As empresas estão avançando para a indústria 4.0, mas as inovações serão limitadas por conta das variáveis externas”, diz Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Logística da Fundação.
Para contornar parte desses riscos, A UPS e a DHL também têm investido em plataformas que calculam eventuais problemas durante a rota de entregas. Em novembro, a unidade de Supply Chain da empresa alemã começou a utilizar um software que identifica as regiões com maior risco de incidentes e informa sobre eventualidades no caminho, como desastres naturais e acidentes. “O Brasil tem um cenário complexo e adversidades que impactam diretamente nos processos logísticos”, diz Eric Brenner, CEO da DHL Global Forwarding Brasil.
Por isso, as empresas buscam alternativas para melhorar a logística e reformular o negócio de entregas no País. A DHL Express no Brasil revelou que vai investir € 5 milhões no Brasil em 2019. De acordo com a presidente da unidade de entregas rápidas, Mirele Mautschke, o foco dos investimentos será em tecnologia e na ampliação do centro de distribuição. “Perceber que há necessidade de crescer e entregar melhor já é um começo”, diz. “O fato de outras companhias chegarem com novas ideias também nos estimula e faz o mercado sair do status quo.” O fato é que a guerra postal das globais pode jogar para escanteio os Correios, a mais antiga estatal brasileira, fundada em 1663. A privatização da companhia, ou parte dela, já está na pauta do governo eleito. Ainda assim, a empresa não acredita que a venda da operação para uma gigante internacional seja uma possibilidade. “Isso não faz sentido. Ninguém faz o que a gente faz”, diz Gabriel Faria, assessor da presidência dos Correios. Segundo ele, assim como as concorrentes, a estatal também está de olho em novas tecnologias e soluções de entregas.
DESVANTAGEM Para conseguir atender à demanda de todas as cidades e capitais do País, a empresa fechou uma parceria com a Azul Linhas Aéreas, para criar uma empresa privada de solução logística voltada para o e-commerce. A joint venture, aprovada no início de dezembro pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), deve começar a operar no primeiro semestre de 2019. A expectativa da companhia é transportar 100 mil toneladas de carga por ano com o modal aéreo. Outras iniciativas têm sido colocadas em prática. Faria antecipou que a partir de janeiro de 2019, a empresa vai testar entrega de encomendas por lockers em algumas cidades. O método, já praticado pela Amazon nos Estados Unidos, direciona os produtos comprados online para armários em algumas regiões da cidade, onde ficam disponíveis para o cliente retirar a mercadoria. “O fato de sermos uma estatal nos coloca em desvantagem para implementar novas tecnologias, mas isso não significa que estamos perdendo mercado”, afirma. Seja qual for o destino dos Correios, o ganho de eficiência no setor de entregas será ótimo, tanto para as empresas quanto para os consumidores brasileiros.
“Ninguém faz o que a gente faz” – Gabriel Faria, assessor da presidência dos Correios